Zao

[Fu Leng]

Cena na sala "Templo", na qual um visitante inesperado aparece para tentar se aliar aos Defensores dos Sete Templos.

[Fu Leng]

Uma das grandes grandes peculiaridades que os historiadores notaram, é que em meados do mês do Macaco de 975 houve algo realmente muito incomum. A presença de um Mahotsukai na corte dos Defensores dos Sete Templos.

Ele chegava cedo lá e se apresentava: Era Zao, nascido nas ilhas da seda… 

...Dois séculos antes.

Zao era produto da prisão e entumbamento de Iushiban em 510. Com a falta de seu líder, todos os grupos de Oradores tiveram que se adaptar. Tudo parecia perdido pois três ordens de samurais lhes caçavam em todos os cantos (e aspectos) do império. Seus números diminuam a cada dia. 

Até que surge o Oráculo de Sangue. Uma entidade nova que passou a liderar todo o culto por meio de sonhos proféticos. Não demoraram para descobrir que o Oráculo nada mais era do que uma magia de Iushiban. Uma magia para manter todo o culto coeso em sua ausência. Com o oráculo, novamente o culto passa a se desenvolver e novos Oradores do Sangue são recrutados. 

E este homem diante dos Defensores era um destes novos recrutas. Sua mensagem era simples, ele desejava trair os próprios comparsas para finalmente poder desertar. 

“Não minto, dizendo que sou um amigo. Eu sou apenas útil. Sou um inimigo que deverá ser caçado sim, mas depois. Depois que minha utilidade tenha desaparecido.

Eu já não possuo muito em comum com o culto e desejo desertar. Mas com a situação atual isso permanece impossível. É necessário um certo caos, uma complicação extrema para que o culto se disperse e eu finalmente me livre. É onde os Defensores entram.

Antes de mais nada, eu preciso tornar algo claro. 

Existe o Mahotsukai baixo, comum, vulgar. E existe o Orador do Sangue, alguém que estudou e dominou a arte de entender e controlar os Kansen. 

A primeira coisa que devemos entender é que os Kansen e os Elementais são duas faces da mesma moeda, nada mais nada menos. Qualquer elemental pode ser Kansen e vice-versa. 

Por isso que podemos invocar magias elementais nas terras sombrias e podemos fazer Maho nas terras de Rokugan. 

A segunda coisa é que eu não ouço o inominável. Não existe uma presença que nos controla… Eu realmente gostaria que fosse. Mas não há nada. Apenas vazio e perguntas sem resposta. Nunca vi em sonhos o “menino com a máscara de porcelana”, nunca obtive respostas em visões… Nada. 

• O inominável, se existiu um dia, já não está mais aqui. 

Existe a mácula, e de fato me vejo ansiando viajar para o sul, para o infame “poço infesto”. Mas isso é o máximo que me aconteceu. 

Por sinal, uma boa forma de procurar os Mahotsukai inferiores, incapazes de controlar a própria mácula, é olhando o sul das cidades. Eles instintivamente vão se voltar para o sul, mas as vezes acham ou precisam ficar em algum lugar fixo em Rokugan. Nestas horas escolherão instintivamente o lugar mais ao sul possível. Sem nem saber deste aspecto “migratório” dos maculados.

Iushiban foi o maior feiticeiro de todos os tempos, já que saiu totalmente na ordem celestial e virou mestre do próprio destino. Tanto que já a morte não lhe alcança. 

• Ele conseguiu algo inédito, controlar a mácula e não ser controlado por ela. 
  

Esta foi sua maior vitória. A descoberta virou técnica e agora nós somos seus donos. Eu mesmo, sem falsa humildade, posso passar minha própria mácula para outras pessoas. E eu já devolvi mácula para “suas fontes” mais de uma vez.

Entretanto, Iushiban apenas preencheu o vazio da figura do Inominável. Pois o oráculo de sangue é muito real e nosso inimigo. Ele é filactério de Iushiban que controla o círculo interno, o tal “círculo de cinco”. Justamente quem tenta derrubar as fortunas. 

Irão notar que “5” será um número recorrente em suas vidas.

Enfim, quem me trouxe aqui foi justamente um destes membros do círculo. Ele se chama Fushiki, um plebeu nascido nas terras Isawa. Yajinden fundiu uma máscara de porcelana no garoto em vida, e misturou sua alma com a de um Kansen. O resultado é o Mahotsukai que vocês encontraram durante as defesas. Um morto-vivo inteligente e extremamente hábil em entender o Maho… Mas sem a capacidade de tomar decisões por si. Por mais que odeie Yajinden, nada pode fazer. É um escravo.

Acontece que parecem ter ‘elaborado melhor’ o ritual e precisam de um ‘voluntário’. E eu, podem entender, estou bem pouco disposto de ser uma cópia melhorada do Fushiki. 

Eu estou vivo a quase dois séculos com minhas próprias artes e não estou disposto a virar um morto-vivo preso a vontade de outro. Justamente vim para este caminho pela liberdade. 

O real motivo da minha visita é muito simples. Eu irei lhes dar informações sobre cada ataque aos templos, quem vem, com quantos vem. Assim como formas de lidar com os problemas. Assim como posso reduzir a mácula de qualquer um que porventura se sinta prejudicado”. 

[Fu Leng]

O relato é de um caçador que tinha seguido uma presa dentro demais na floresta.

Fushiki é um homem bem magro e pequeno, usando talas médicas sujas enroladas por todo o corpo e uma máscara de porcelana que lhe cobre a face. Ele usa um robe longo e capuz o tempo todo. Sua voz é estranha, rouca e fraca.

Zao é um rapaz novo, formoso e leve, usando vestes ricas, totalmente brancas que refletem bastante a luz do sol.

Zao: —...Mas o que mais incomoda mesmo são os dentes. A maior parte dos humanos tem os dentes mais ou menos no mesmo lugar, mais ou menos na mesma quantidade. Mas eles estão sempre em uma disposição levemente diferente que incomoda muito. Eu fico horas, senão dias, passando a lingua nos dentes tentando acostumar. Claro que logo de cara a primeira coisa que me irrita é a falta de higiene. A maior parte das pessoas poderia se lavar melhor. Já tive cada surpresa desagradável... Mas enfim, não acho que vim aqui para falar das minhas experiências pessoais.

Fushiki: —De fato, não... São novas ordens do Oráculo de Sangue.

Zao: —Outro Sonho?

Fushiki: —Isso.

Zao: —O que "ele" disse?

Fushiki: —Que nós devemos nos preparar para receber o reforço dos perdidos... Os perdidos treinados por Moto Tsume.

Zao: —Esta é uma ideia horrorosa. Estes fanáticos só querem destruir tudo, jogar a doença da mácula nas quatro direções e servir "o inominável". Esta é uma das razões para pararmos de ouvir o tal Oráculo!
 
Fushiki: —Blasfêmia...

Zao: —Eu sou um orador do sangue, o dia não está completo sem uma blasfêmia! Se acostume.

Não foi para isso que Iuchiban se rebelou.

Ele queria conquistar o império, não o destruir. Ele queria ser imperador, não abrir os pergaminhos negros e soltar "o inominável". Mas agora Iuchiban está preso em uma tumba a séculos!! O que vocês esperavam que iria acontecer? Todo este tempo com a mácula crescendo, consumindo a alma dele, sem ter como ele a liberar. Nós perdemos Iuchiban para a mácula! Ele é apenas outro doente maluco! Esta parte do "culto" que realmente me irrita pela sua literalidade.

Fushiki: —Fu Leng.

Zao: —Quê?

Fushiki: —Fu Leng. Zao-kun fica dizendo "O inominável", mas deveria dizer Fu Leng. Ora, qual o problema Zao-kun? Achei que não acreditava no Deus Caído...

Zao: —Eu não acredito. Mas também não sinto uma curiosidade mórbida de descobrir a verdade.

Fushiki: —Zao-kun sabe lá no fundo que Fu Leng é de verdade então... Que "fofo".

Zao: —Não é nada disso... Eu só não entendo esta mania de destruir a própria casa. Temos tudo: vida eterna, poderes fantásticos e uma forma de burlar a loucura associada a mácula. Eu não quero viver em uma terra sombria gigante com...

...Absolutamente nada!

Os perdidos que tentam ter filhos, já viu como nascem as "crianças"? Se é que podemos chamar aquelas coisas semi-mortas-vivas de criança? Este é o único lugar que nós temos para viver. Eu gosto de comer bem, de dormir bem, de bom sexo. Eu adoro sexo. Eu gosto de várias coisas que só podemos encontrar em Rokugan. Olha minhas vestes, que preciosidade, onde eu encontraria algo assim nas terras sombrias? Lógico que Fushiki não entende... É um zumbi decrépito preso a um corpo morto. Como poderia? 

Fushiki: —Esta roupa é de fato bem bonita.

Zao: —Obrigado.

Fushiki saca uma espécie de faca de lâmina larga e em um movimento veloz começa a golpear o peito do Zao repetidas vezes. Ambos caem engalfinhados conforme o sangue verte do peito, manchando totalmente o Kimono.

Zao: —Não! NÃO!! NÃO!! Oh... Desgraçado... Dói... Esta roupa... Foi cara... Ah... Seu burro... Agora eu entendo o motivo... Inveja. Seu zumbizinho invejoso...

Fushiki: —Obrigado Zao-kun, mais um cadáver para a pilha... Mas não morra ainda... Antes de morrer me escuta... Obedece e vá receber os perdidos como ordenado, ou vamos achar seu corpo principal, entendido? 

Naturalmente o caçador assustou-se com a cena e foi contar dela para os Defensores. 

[Fu Leng]

As aulas eram chatas, na sombra da árvore. Ossos de dragões espalhados sobre a terra e rimas antigas esquecidas, um monte de teoria que o feiticeiro lhe importunava.

Zao: —...Concentre-se no som da luz do metal quando eu... Ei! Pare de roer as unhas. Isso está ficando nojento, olha os seus dedos! Eu vou ter que tirar a mácula de Suzuko-san... 

Suzuko: —Eu consigo lançar Maho. Não preciso de "aulas" meu pequeno orador do sangue... Fushiki-sama me ensinou tudo o que eu preciso saber.

Fushiki se aproximava: —Eles vieram, vamos... Vamos ver os perdidos.

Os Akutsukai eram um bando difuso, homens e mulheres que possuiam um aspecto doentio. Alguns eram muito magros que era uma surpresa como conseguiam arrastar os próprios corpos, quanto mais carregar a armadura e seus equipamentos. A maioria fedia, tinha dentes podres e gengivas negras. Lábios trincados pelos quais escorria uma saliva pegajosa e levemente amarelada. Esta pingava do queixo pelo peito e barriga abaixo. Os tufos de cabelo que ainda se mantinham na cabeça eram brancos. 

Fushiki ergueu os braços os saudando. Eram enfim o reforço que viera das terras sombrias e lhes ajudaria com a derrubada dos templos. O feiticeiro Zao, agora no corpo de um homem mais forte, diferente, mas ainda usando um kimono branco, se mantinha desconfiado, de braços cruzados. Suzuko se mantinha atrás dos dois, olhando desconfiada por sobre os ombros deles. E... Pela primeira vez, ela percebeu o que a mácula havia feito com ela. Cabelos brancos, falhos, feridas pelo corpo.

Fushiki: —Bem vindos, meus caros... Devem estar cansados da viagem longa... Será que não desejam descansar um pouco e se recuperar antes de planejarmos nosso próximo passo?

Um dos perdidos apenas olhou para Fushiki, virou na direção dele mas não realmente o viu. Podia ser cego até onde os oradores entendiam.

Akutsukai: —Eu não consigo acordar deste pesadelo... Deve ser porque eu não consigo mais dormir... 

Os outros que se aproximavam gemiam, diziam coisas que faziam pouco ou nenhum sentido e os oradores do sangue se entre-olharam. Foi neste momento que um dos perdidos virou o rosto na direção de uma pequena habitação que ficava a milhas dali.

Akutsukai: —Sinto pureza que precisa morrer... Sacrifique... Somos todos os mesmos, difundir a mácula... 

Suzuko: —Olha... Vendo assim... Agora... Zao parecia que tinha razão.

Fushiki intervém, ficando no caminho: —O que estão sentindo são apenas algumas pessoas simples em uma casa, não devemos os atacar, pois iria denunciar nossa base de operações. Hum? Não precisamos de Miharus vasculhando cada polegada desta floresta, hum?

Mas os Akutsukai falavam sobre sóis mortos, dor, sofrimento, insanidades e já não tinham paciência para esperar. Um tabefe mandou o corpo leve e morto do Fushiki contra uma árvore. O impacto teria matado alguém menos resistente, mas Fushiki a muito havia superado certas limitações mortais. Ele havia sido quebrado em dois pedaços, mas ainda vivia. Se arrastava pelo chão usando as mãos, deixando as pernas e o quadril para trás.

Fushiki rosna: —Eu odeio quando o Zao está certo! Zumbis! Escravos, levantem e matem estes perdidos!!

Ocultos pelas folhagens e matos rasteiros a horda morta-viva se interpõe e começa a combater contra os próprios perdidos. Mas eles são obviamente pouco eficentes. Cada perdido é muito poderoso e consegue com facilidade destruir os zumbis de Fushiki. E neste momento, detrás dos Akutsukai aparece seu líder. Um homem vestido de negro que a mácula não emagreceu totalmente. O Albino começou a invocar um Maho tão poderoso que começou a controlar os Zumbis.


Albino: —Toda a mácula pertence a Fu Leng!!

Os oradores do sangue rapidamente ficavam sem seu exército de mortos e ficavam em assustador menor número. Estavam cercados.

Suzuko se virando para Zao: —Faça alguma coisa!

Zao puxa a tanto do Obi e esfaqueia a Suzuko nas costelas —Eu preciso do seu sangue... Carregue a mácula pesada que esta magia vai te entregar.

Suzuko sentiu a dor do corte traiçoeiro, o sangue lhe vertendo pela ferida. Este mesmo sangue virava magia controlada pela mão do feiticeiro. E com um gesto vigoroso, todos os perdidos, inclusive o seu líder, caíram no chão. Porém, infelizmente os zumbis ainda controlados por Fushiki também. Todos se contorciam ali. Tremendo e tentando se recuperar.

Suzuko: —O que foi isso? Ai! Você vive dizendo para eu não aumentar a minha mácula e vc me passou mais mácula? O que você fez afinal?

Zao: —Naturalmente eu prego o que eu acredito. Esta magia corta a ligação deles com a mácula, viu a diferença entre um Mahotsukai e um Orador de Sangue? Teoria é importante. Enquanto eu mantiver a concentração, eles não vão conseguir lançar Maho ou conseguir usar da mácula para os sustentar. Vá para os Defensores dos Sete Templos e avise que os perdidos estão aqui. Eu irei os segurar aqui.

Suzuko: —O quê?! Eu entendi direito?? Chamar os Defensores dos Sete Templos? Zao!! Você É MACULO??

Zao: —Vai logo. Eu não posso segurar eles para sempre.

Suzuko: —São quatro horas até a capital! E você nem sabe se eles virão? Eles são covardes!

Zao: —Sim, são covardes, mas também são idiotas, existe uma chance de virem... Eles são sua única esperança.

Suzuko: —"nossa" esperança, certo? "Nossa"... Você também vai se ferrar, certo?

Zao: —Aham, claro que vou. Vai logo.